Por Flávio Dino*
Milhões de pessoas foram às ruas nas últimas semanas em várias cidades do Brasil, inclusive aqui no Maranhão. Entre as mais variadas demandas, havia um clamor comum: que os serviços públicos de nosso país tenham a qualidade de uma nação desenvolvida. Se o Brasil se desenvolveu economicamente nos últimos anos ao ponto de almejar ser, em breve, a quinta maior economia do mundo, por que isso não vai se refletir em ganhos reais de qualidade de vida para os 190 milhões de brasileiros?
Nos últimos 20 anos houve um crescimento da qualidade de vida graças às políticas de inclusão social e de estabilização econômica, mas é necessário admitir que ainda não atingimos a meta exigida nas ruas.
Entre tantos serviços desejados pelos cidadãos, um dos que mais se destacam é o de saúde. Diferentes pesquisas de opinião sempre a colocam no topo das preocupações da sociedade brasileira. Uma pesquisa recente, feita ano passado, mostra que 8 em cada 10 brasileiros lembraram das palavras “saúde” ou “hospitais”, quando perguntados sobre qual o principal problema do Brasil hoje.
Os problemas não são exclusividade da saúde pública, como alguns tentam pintar. Os planos de saúde não têm se mostrado uma solução eficaz, repetindo muitos problemas do sistema público, como filas de espera e a recusa de atendimentos. Não por acaso, o número de reclamações contra planos de saúde quintuplicou em 10 anos: indo de 16.415 para 75.916 registros na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
As soluções não são simples. Passam, certamente, pelo aumento de investimentos em hospitais e em infraestrutura de atendimento. Mas isso não é suficiente. Penso que também é necessária uma mudança cultural. A saúde acabou virando um “negócio” como outro qualquer, como a venda de um pacote turístico, a compra de um carro ou o loteamento de um terreno. Só que estamos tratando da garantia da vida de um ser humano, com possibilidades de danos graves, irreversíveis e impossíveis de indenizar (como a morte precoce e evitável de um filho).
Portanto, não adianta fazer apenas grandes investimentos na estrutura de atendimento. Hospitais bem equipados com aparelhos de última geração, disponibilidade de medicamentos, tudo é importante para garantir a saúde da população. Mas o núcleo do atendimento ainda é a relação médico-paciente, como o era 400 anos antes de Cristo, na Grécia de Hipócrates, o pai da Medicina.
Infelizmente, vivemos em um país em que há poucos médicos. Na Inglaterra, país que tem um sistema público de referência, há 3,8 médicos para cada mil habitantes. Na Argentina, bem aqui ao lado, são 3,2 médicos para cada mil habitantes. No Brasil, escandalosos 1,8 médicos por mil habitantes. Pior: esses escassos médicos estão mal distribuídos por nosso país. Enquanto em Brasília, Rio e São Paulo, há mais de 2 médicos por mil habitantes, no Maranhão, temos apenas 0,41 médicos por cada mil habitantes. Em todo o país, há 700 cidades que não possuem um único médico para atender no local, dia nenhum, nunca. A esses municipios, se somam aqueles – a maioria – que tem medicos apenas em alguns dias na semana, como se os pacientes pudessem esperar. Sao muito conhecidos os casos das cidades que procuram pediatras e não conseguem, mesmo oferecendo salários de R$ 20 mil ou ate 30 mil reais.
Diante da situação, o governo federal tomou uma medida transitoriamente necessária. Vai abrir um edital oferecendo vagas para medicos, com salários competitivos. As vagas que não forem preenchidas por médicos brasileiros serão oferecidas a estrangeiros. A ideia não é uma novidade em termos mundiais. Na Austrália, 30% dos médicos são estrangeiros. No Reino Unido, 27%. E no Canadá, 24%.
Paralelamente, haverá investimentos em novos cursos e em mais vagas para medicina nas Universidades, de modo a que mais profissionais sejam formados para atender à sociedade. Esperamos que o governo do estado se movimente para atacar tão graves problemas. As dores, sofrimentos e mortes evitáveis não podem continuar.
Flávio Dino, 45 anos, é presidente do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur), foi deputado federal e juiz federal